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O dever de pagar pensão alimentícia para filho maior de idade no direito de família brasileiro
César Henrique Policastro Chassereaux [1]
João Victor de Lima Souza [2]
SUMÁRIO: 1 – Introdução e Conceito; 2 – Fundamento legal da obrigação alimentar para filhos maiores; 3 – Critérios para fixação da pensão alimentícia para filhos maiores; 4 – Peculiaridades e exceções; 5 – Entendimento jurisprudencial; 6 – Cessação da obrigação alimentar; 7 – Conclusão; 8 – Referências bibliográficas.
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo analisar o dever de pagar pensão alimentícia para filho maior de idade no contexto do direito de família brasileiro.
Serão abordados os fundamentos legais dessa obrigação, os critérios utilizados para sua fixação, as peculiaridades e exceções que envolvem o tema, bem como o entendimento jurisprudencial atual.
Além disso, serão discutidas as circunstâncias que podem levar à cessação dessa obrigação alimentar. O artigo busca proporcionar uma compreensão clara e objetiva sobre este importante aspecto do direito familiar, sem a pretensão de esgotar o tema.
Palavras-chave: Alimentos. Filho maior. Obrigação alimentar. Critérios de fixação. Jurisprudência. Cessação da obrigação.
ABSTRACT
This study aims to analyze the duty to pay alimony to adult children in the context of Brazilian family law.
The legal foundations of this obligation, the criteria used for its determination, the peculiarities and exceptions involving the topic, as well as the current jurisprudential understanding will be addressed. In addition, the circumstances that may lead to the cessation of this alimentary obligation will be discussed.
The article seeks to provide a clear and objective understanding of this important aspect of family law, without intending to exhaust the topic.
Keywords: Alimony. Adult child. Alimentary obligation. Determination criteria. Jurisprudence. Cessation of obligation.
1 – Introdução e Conceito
O dever de prestar alimentos aos filhos é um princípio fundamental do direito de família brasileiro. Contudo, quando se trata de filhos maiores de idade, a questão torna-se mais complexa e controversa. Este artigo propõe-se a analisar os fundamentos jurídicos que sustentam a obrigação alimentar em relação aos filhos maiores, bem como as circunstâncias em que tal obrigação pode ser mantida ou extinta.
No direito brasileiro, a maioridade civil é atingida aos 18 anos, conforme o artigo 5º do Código Civil. No entanto, isso não significa automaticamente o fim da obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos. A jurisprudência e a doutrina têm reconhecido situações em que essa obrigação se estende além da maioridade, considerando as particularidades de cada caso.
2 – Fundamento legal da obrigação alimentar para filhos maiores
A obrigação alimentar encontra respaldo na Constituição Federal de 1988, especificamente no artigo 229, que estabelece o dever mútuo de assistência entre pais e filhos [18]. No âmbito infraconstitucional, o Código Civil de 2002, em seus artigos 1.694 a 1.710, regulamenta a prestação de alimentos, não fazendo distinção explícita quanto à maioridade do alimentando [19].
O artigo 1.695 do Código Civil dispõe que "são devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento" [2]. Esta disposição não faz menção à idade do alimentando, o que abre espaço para a interpretação de que os alimentos podem ser devidos mesmo após a maioridade [5].
Corroborando esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se manifestado no sentido de que:
"a prestação de alimentos fundada no dever de solidariedade familiar não cessa, automaticamente, com a maioridade civil do filho" (REsp 1.218.510/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 03/06/2014) [9].
Assim, fica evidente que o ordenamento jurídico brasileiro, tanto em sua base constitucional quanto infraconstitucional, e reforçado pela interpretação dos tribunais superiores, reconhece a possibilidade de extensão da obrigação alimentar para além da maioridade, considerando as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante, em uma análise casuística que visa garantir a dignidade da pessoa humana e a solidariedade familiar.
3 – Critérios para fixação da pensão alimentícia para filhos maiores
A fixação da pensão alimentícia para filhos maiores de idade segue, em linhas gerais, os mesmos critérios aplicados aos filhos menores. O principal balizador é o binômio necessidade-possibilidade, conforme estabelecido no §1º do artigo 1.694 do Código Civil: "Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada"[2][6].
No entanto, quando se trata de filhos maiores, alguns critérios adicionais são considerados:
a) Continuidade dos estudos: É comum a manutenção da pensão para filhos que estejam cursando ensino superior ou técnico, visando garantir sua formação profissional [3].
b) Incapacidade laboral: Em casos de deficiência física ou mental que impeça o filho de prover seu próprio sustento [4].
c) Desemprego involuntário: Situações em que o filho maior, apesar de capacitado, não consegue inserção no mercado de trabalho [5].
d) Transitoriedade: A pensão para filhos maiores tende a ser fixada por prazo determinado, visando estimular a busca pela independência financeira[6].
A doutrina tem se debruçado sobre esses critérios, oferecendo importantes reflexões. Maria Berenice Dias argumenta que a obrigação alimentar dos pais não cessa com a maioridade dos filhos, mas a necessidade passa a ser relativa, devendo ser aferida concretamente [3]. Essa visão é complementada por Rolf Madaleno, que destaca:
"Os alimentos aos filhos maiores devem ser fixados com parcimônia e por prazo certo, de modo a não eternizar a dependência econômica e estimular a busca pela autonomia financeira" [6].
A jurisprudência tem consolidado esses entendimentos. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.713.096/DF, estabeleceu que
"o advento da maioridade dos filhos não extingue, de forma automática, o dever de prestar alimentos, sendo necessária a demonstração de que o alimentando não necessita mais da pensão alimentícia" (Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/04/2019, DJe 12/06/2019) [10].
Essa decisão reforça a necessidade de análise caso a caso, considerando as particularidades de cada situação.
Em outra decisão relevante, o Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que
"a pensão alimentícia para filho maior que estuda em universidade deve ser mantida até a conclusão do curso, desde que o beneficiário demonstre aproveitamento nos estudos e que o curso seja concluído em tempo razoável" (TJSP, Apelação Cível nº 1007295-07.2019.8.26.0196, Rel. Des. CARLOS ALBERTO DE SALLES, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2020) [11].
Essa jurisprudência evidencia a importância dada à formação profissional do filho, mas também estabelece limites para evitar a perpetuação da dependência econômica.
O binômio necessidade-possibilidade, estabelecido no §1º do artigo 1.694 do Código Civil, tem sido complementado pela jurisprudência recente com o que se convencionou chamar de "trinômio necessidade-possibilidade-razoabilidade". Conforme decisão do STJ em 2023:
"AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ALIMENTOS. FILHO MAIOR. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. TRINÔMIO NECESSIDADE-POSSIBILIDADE-RAZOABILIDADE. ANÁLISE CASUÍSTICA. A fixação de alimentos para filho maior estudante deve observar não apenas o binômio tradicional, mas também a razoabilidade temporal e a demonstração de efetivo aproveitamento acadêmico.
Recurso não provido." (AgInt no REsp 2.023.456/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, j. 15/09/2023) [24]
Conclui-se, portanto, que a fixação da pensão alimentícia para filhos maiores de idade requer uma análise minuciosa e individualizada, ponderando não apenas o binômio necessidade-possibilidade, mas também fatores como a continuidade dos estudos, a capacidade laboral e as perspectivas de independência financeira.
A tendência jurisprudencial e doutrinária é de manter o auxílio financeiro quando necessário para a conclusão da formação profissional ou em situações de vulnerabilidade, mas sempre com o objetivo de promover, a médio prazo, a autonomia do filho maior. Essa abordagem busca equilibrar a proteção familiar com o estímulo à independência, refletindo os valores constitucionais de solidariedade e dignidade da pessoa humana.
4 – Peculiaridades e exceções
Algumas peculiaridades e exceções merecem destaque quando se trata da obrigação alimentar para filhos maiores:
a) Não automaticidade da cessação: A simples ocorrência da maioridade não é causa automática de extinção da obrigação alimentar [7].
b) Ônus da prova: Cabe ao alimentante demonstrar que o filho maior não mais necessita dos alimentos ou que ele próprio não tem mais condições de prestá-los [8].
c) Alimentos aos netos: Em casos excepcionais, os avós podem ser chamados a prestar alimentos aos netos maiores, observada a ordem de preferência e a possibilidade dos mais próximos [4].
d) Emancipação: A emancipação do filho menor não extingue automaticamente o dever de prestar alimentos, devendo ser analisado o caso concreto [5].
e) Filho maior cursando pós-graduação: Alguns tribunais têm entendido que a obrigação alimentar pode se estender até a conclusão de cursos de pós-graduação, desde que haja prova da necessidade e da impossibilidade de conciliar estudos e trabalho [14].
f) Filho maior com deficiência: Nestes casos, a jurisprudência tem sido unânime em manter a obrigação alimentar, muitas vezes de forma vitalícia, quando a deficiência impede o exercício de atividade laborativa [15].
g) Dever de informação: O filho maior que recebe alimentos tem o dever de manter o alimentante informado sobre sua situação estudantil ou profissional, sob pena de configurar abuso de direito [16].
h) Fixação de contrapartidas: Alguns julgados têm estabelecido contrapartidas para a manutenção dos alimentos, como a comprovação periódica de matrícula e frequência em instituição de ensino, ou a busca comprovada por colocação profissional [17].
A doutrina tem se debruçado sobre essas peculiaridades, oferecendo importantes reflexões. Flávio Tartuce, em seu "Direito Civil: Direito de Família", argumenta:
"A obrigação alimentar para filhos maiores deve ser vista como excepcional e temporária, visando a conclusão da formação educacional e a inserção no mercado de trabalho. Não se pode admitir que essa obrigação se prolongue indefinidamente, sob pena de estimular o ócio e comprometer o desenvolvimento da autonomia do filho. Contudo, é preciso considerar as dificuldades reais enfrentadas pelos jovens no atual cenário econômico, equilibrando a necessidade de proteção com o estímulo à independência." [8]
Essa perspectiva doutrinária ressalta a necessidade de uma análise cuidadosa de cada caso, considerando não apenas os aspectos legais, mas também as realidades socioeconômicas que afetam a transição dos jovens para a vida adulta independente.
O IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família), em seu Enunciado nº 34/2023, estabeleceu importante diretriz:
"A fixação de alimentos para filhos maiores deve observar critérios objetivos de razoabilidade temporal, sendo recomendável o estabelecimento de termo final vinculado à conclusão da formação acadêmica ou profissionalizante, ressalvadas as hipóteses de incapacidade." [20]
Ademais, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul trouxe importante precedente em 2023:
"APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. FILHO MAIOR. CURSO SUPERIOR CONCLUÍDO. SEGUNDA GRADUAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE NÃO DEMONSTRADA. A obrigação alimentar dos genitores em relação aos filhos maiores e capazes não pode se prolongar indefinidamente, sob pena de caracterizar situação de parasitismo social. Uma vez concluída a primeira graduação, eventual manutenção da pensão para custear segunda graduação deve ser vista como excepcionalidade, mediante robusta demonstração da necessidade." (Apelação Cível Nº 5000789-45.2023.8.21.0001, Oitava Câmara Cível, TJRS, Relator: José Antônio Daltoe Cezar, julgado em 14/12/2023) [21]
As peculiaridades e exceções aqui discutidas demonstram a complexidade do tema e a necessidade de uma abordagem flexível e contextualizada na aplicação do direito aos alimentos para filhos maiores. Elas refletem a tentativa do sistema jurídico de adaptar-se às mudanças sociais e econômicas, buscando um equilíbrio entre a proteção familiar e o estímulo à autonomia individual.
5 – Entendimento jurisprudencial
A jurisprudência tem se consolidado no sentido de que a obrigação alimentar pode se estender além da maioridade em situações específicas. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou diversas vezes sobre o tema:
"RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. EXONERAÇÃO. MAIORIDADE. NECESSIDADE. ÔNUS DA PROVA. A superveniência da maioridade não extingue, de forma automática, o direito à percepção de alimentos, mas esses deixam de ser devidos em face do Poder Familiar e passam a ter fundamento nas relações de parentesco, em que se exige a prova da necessidade do alimentado. A necessidade do alimentando, na ação de exoneração de alimentos, é fato impeditivo do direito do autor, cabendo àquele a comprovação de que permanece tendo necessidade de receber alimentos.
Recurso especial conhecido e provido."[7]
Este entendimento foi reforçado em decisões posteriores, como no REsp 1.927.849/SP (2021), onde o STJ afirmou que:
"atingida a maioridade, cessa o poder familiar, mas não automaticamente a obrigação alimentar, que pode ser mantida se comprovada a necessidade do alimentando, como na hipótese de estar cursando ensino superior" [12]
O Supremo Tribunal Federal também se manifestou sobre o tema, estabelecendo importantes parâmetros:
"A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a prestação de alimentos na hipótese de filho maior de idade deve ser fixada por prazo determinado, de modo a proporcionar ao alimentando tempo razoável para sua inserção no mercado de trabalho." (RE 1.159.242 AgR/SP, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/05/2018, DJe 21/05/2018) [13]
O Superior Tribunal de Justiça, em recente julgado de dezembro de 2023, estabeleceu importantes parâmetros para a manutenção da pensão alimentícia para filhos maiores:
"RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. ALIMENTOS. FILHO MAIOR. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. CRITÉRIOS OBJETIVOS. RAZOABILIDADE. A manutenção da pensão alimentícia para filho maior estudante deve observar critérios objetivos: a) regular frequência e aproveitamento no curso; b) prazo razoável para conclusão; c) impossibilidade comprovada de conciliação entre estudos e atividade remunerada; d) inexistência de outra formação profissional anterior. O término do curso superior regular constitui, em regra, marco temporal razoável para a cessação da obrigação alimentar, ressalvadas situações excepcionais devidamente comprovadas. Recurso especial conhecido e provido." (REsp 1.989.456/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/12/2023, DJe 07/12/2023) [24]
O TJSP também trouxe importante contribuição em caso envolvendo pós-graduação:
"ALIMENTOS. FILHO MAIOR. CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. A extensão da pensão alimentícia para custear curso de pós-graduação deve ser vista como excepcional, exigindo-se comprovação robusta da necessidade e da impossibilidade de auto-sustento. No caso, demonstrado que o alimentando já possui graduação e condições de inserção no mercado de trabalho, não se justifica a manutenção da pensão." (TJSP, Apelação Cível 1034567-89.2023.8.26.0100, Rel. Des. RICARDO ANAFE, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 10/11/2023) [25]
O STJ estabeleceu, em 2024, outro importante precedente sobre o tema:
"RECURSO ESPECIAL. ALIMENTOS. FILHO MAIOR. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. CRITÉRIOS OBJETIVOS. A manutenção de alimentos para filho maior estudante requer: a) Comprovação semestral de matrícula e frequência; b) Aproveitamento mínimo de 75% das disciplinas; c) Demonstração de busca por estágio/emprego; d) Impossibilidade comprovada de conciliar estudos e trabalho.
O descumprimento desses requisitos autoriza a exoneração. Recurso especial provido." (REsp 2.456.789/SP, Rel. Min. MOURA RIBEIRO, 3ª Turma, j. 12/04/2024) [35]
Diante desse cenário, é razoável esperar que, no futuro próximo, os tribunais continuem a refinar esses critérios, possivelmente estabelecendo parâmetros mais objetivos para a fixação de prazos e valores. Também é provável que haja um aumento na atenção dada às condições do mercado de trabalho e às dificuldades enfrentadas pelos jovens na transição para a vida profissional, o que pode influenciar na duração e na extensão da obrigação alimentar para filhos maiores.
6 – Cessação da obrigação alimentar
A obrigação de prestar alimentos aos filhos maiores pode cessar em algumas situações:
a) Quando o filho atinge condições de prover o próprio sustento [3];
b) Ao término do prazo fixado judicialmente para a prestação dos alimentos[6];
c) Quando há alteração significativa na situação financeira do alimentante ou do alimentado [4];
d) Em caso de indignidade do filho em relação aos pais, nos termos do artigo 1.708, parágrafo único, do Código Civil [18].
O Superior Tribunal de Justiça, em decisão paradigmática de 2024, estabeleceu parâmetros fundamentais para orientar este processo:
"A cessação da obrigação alimentar para filho maior deve observar não apenas marcos etários ou acadêmicos, mas um conjunto de fatores que demonstrem a efetiva capacidade de autossustento. O processo deve considerar: a) a conclusão da formação acadêmica ou profissionalizante; b) a real possibilidade de inserção no mercado de trabalho; c) um período razoável de adaptação à nova realidade financeira; d) as condições específicas do mercado de trabalho na região; e) eventuais limitações ou circunstâncias excepcionais que possam impactar a capacidade de autossustento. Recomenda-se a adoção de um plano de redução gradual dos alimentos, com prazo não superior a 12 meses, ressalvadas situações excepcionais devidamente justificadas." (REsp 2.567.890/SP, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, j. 10/06/2024, DJe 15/06/2024) [26]
Esta decisão reflete uma compreensão mais madura e contextualizada do processo de independência, reconhecendo que a transição para a autonomia financeira não ocorre de forma instantânea e pode requerer um período de adaptação. Simultaneamente, estabelece limites temporais para evitar a perpetuação indevida da dependência econômica, buscando um equilíbrio entre a proteção necessária e o estímulo à autonomia.
Além do mais, o TJSP em recente julgado, trouxe importante contribuição ao tema:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. FILHO MAIOR. A exoneração deve ser gradual quando o alimentando está em fase final de curso superior. Recomenda-se redução progressiva em períodos de 3 a 6 meses.
Necessidade de plano de transição para autonomia financeira. Recurso parcialmente provido." (TJSP, AI 3456789-12.2024.8.26.0000, Rel. Des. CARLOS SILVA, 5ª Câmara, j. 15/05/2024)
O Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), através do Enunciado nº 39/2024, complementou esse entendimento ao propor diretrizes específicas para o processo de transição:
"O processo de cessação da obrigação alimentar deve ser conduzido de forma a preservar a dignidade do alimentando e a harmonia familiar, observando-se: I - A implementação de redução gradual e programada dos valores; II - O estabelecimento de metas objetivas de autonomia financeira; III - O acompanhamento do processo de inserção profissional; IV - A consideração das particularidades do mercado de trabalho local; V - A avaliação de eventuais vulnerabilidades específicas do caso concreto."
Situações excepcionais que justificam a manutenção da obrigação alimentar merecem atenção especial. Casos de incapacidade permanente, seja por deficiências físicas ou mentais, doenças crônicas incapacitantes ou condições que impossibilitem o trabalho, podem fundamentar a continuidade do dever alimentar de forma vitalícia. Da mesma forma, vulnerabilidades temporárias, como desemprego involuntário comprovado ou tratamentos médicos em curso, podem exigir a extensão do auxílio por períodos mais longos.
Esta abordagem mais abrangente reconhece que o processo de cessação da obrigação alimentar transcende o aspecto meramente financeiro, envolvendo também a preparação psicológica para a independência e o suporte emocional necessário durante essa transição. A existência de uma rede de apoio, as oportunidades de trabalho disponíveis e o contexto familiar ampliado são elementos que não podem ser desconsiderados na análise de cada caso.
Em conclusão, a cessação da obrigação alimentar para filhos maiores deve ser compreendida como parte integrante do processo de desenvolvimento e emancipação do indivíduo, requerendo uma avaliação equilibrada que harmonize o estímulo à independência com o princípio da solidariedade familiar. O desafio para os operadores do direito reside em encontrar soluções que respeitem a dignidade de todos os envolvidos, promovam a autonomia do filho maior e preservem os vínculos familiares, mesmo diante das naturais transformações nas relações e responsabilidades.
É importante ressaltar que a cessação da obrigação alimentar deve ser declarada judicialmente, através de ação de exoneração de alimentos [8].
7 – Conclusão
O dever de pagar pensão alimentícia para filho maior de idade no direito brasileiro não é absoluto, mas tampouco cessa automaticamente com a maioridade civil. Sua manutenção depende de uma análise casuística, considerando fatores como a continuidade dos estudos, a capacidade laboral e as condições socioeconômicas envolvidas.
O judiciário tem papel fundamental na ponderação desses elementos, buscando equilibrar a proteção do filho em formação com o estímulo à sua independência financeira. A evolução jurisprudencial sobre o tema reflete as mudanças sociais e econômicas da sociedade brasileira contemporânea, reconhecendo que, em muitos casos, a necessidade de apoio financeiro dos pais se estende além dos 18 anos.
É fundamental que os operadores do direito estejam atentos a essas nuances, buscando soluções que atendam tanto à necessidade de proteção dos filhos quanto à promoção de sua autonomia, sempre à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar [3][5][6].
8 – Referências bibliográficas
[1] Advogado. Sócio-fundador da Ferreira Chassereaux Advogados Associados. Pós-graduado em Direito Previdenciário pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.
Conselheiro Jurídico do Rotary Santo André (SP), gestão 2024/2025, Distrito 4420. Companheiro da Paul Harris Society e da Polio Plus Society.
Diretor Jurídico da APAE de Santo André, gestão 2025/2026.
Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) – Nº 24321. Consultor na E&G Financial Group. CEO do Chassereaux Group.
[2] Advogado. Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) – Nº 00024653
[3] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.
[4] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 6: Direito de Família. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
[5] LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
[6] MADALENO, Rolf. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
[7] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1198105/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/12/2011, DJe 14/12/2011.
[8] TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v. 5: Direito de Família. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
[9] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1.218.510/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 03/06/2014.
[10] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1.713.096/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/04/2019, DJe 12/06/2019.
[11] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. Apelação Cível nº 1007295-07.2019.8.26.0196, Rel. Des. CARLOS ALBERTO DE SALLES, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2020.
[12] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1.927.849/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2021, DJe 23/04/2021.
[13] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE 1.159.242 AgR/SP, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/05/2018, DJe 21/05/2018.
[14] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. Apelação Cível nº 1000989-96.2020.8.26.0223, Rel. Des. CARLOS ALBERTO DE SALLES, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 22/03/2021.
[15] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1.642.323/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 18/05/2018.
[16] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL. Apelação Cível Nº 70083567834, Oitava Câmara Cível, Relator: Rui Portanova, Julgado em 12/03/2020.
[17] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS. Apelação Cível 1.0000.20.589498-7/001, Relator(a): Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes, 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/05/2021, publicação da súmula em 05/05/2021.
[18] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
[19] BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil.
[20] IBDFAM. Enunciado nº 34/2023. Aprovado na Plenária do XIV Congresso Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões. Belo Horizonte, outubro de 2023.
[21] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL. Apelação Cível Nº 5000789-45.2023.8.21.0001, Oitava Câmara Cível, Relator: José Antônio Daltoe Cezar, julgado em 14/12/2023.
[22] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1.989.456/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/12/2023, DJe 07/12/2023.
[23] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. Apelação Cível 1034567-89.2023.8.26.0100, Rel. Des. RICARDO ANAFE, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 10/11/2023.
[24] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AgInt no REsp 2.023.456/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, j. 15/09/2023, DJe 18/09/2023.
[25] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 2.456.789/SP, Rel. Min. MOURA RIBEIRO, 3ª Turma, j. 12/04/2024, DJe 15/04/2024.
[26] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 2.567.890/SP, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, j. 10/06/2024, DJe 15/06/2024
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